Potes que guardam vidas, vidas que viram histórias: a poteca como ação interativa nas narrativas de crianças e adultos do Assentamento Rose, na região sisaleira de Santaluz, BA

Tese
Resumo: 
Infâncias, culturas, identidades, memórias, adversidades, pluralidades. Ampliar o foco, abrir o olhar, aguçar os ouvidos, ajustar o compasso, carregar nas cores, assim afinei meus passos para caminhar com um grupo de crianças de um assentamento de reforma agrária, o Assentamento Rose, na cidade de Santaluz, BA. Se a infância não pode ser pensada enclausurada na dimensão cronológica, mais ainda a infância campesina pode ser concebida de forma reduzida. Falo de crianças que crescem envoltas na incerteza da posse da terra, que se educam na luta, que aprendem desde cedo que a organização coletiva é a arma da vitória e ao mesmo tempo um meio de resistência. Vivi essa infância plural com objetivo de analisar, através das narrativas orais de crianças e adultos de um assentamento de reforma agrária, os processos constitutivos da Cultura, das Culturas de Infância e das identidades de um grupo de crianças camponesas. A forma de caminhar foi conduzida por três categorias: Crianças assentadas e as relações com as Culturas da Infância e Identidades; Educação, cultura e participação democrática na constituição identitária das crianças assentadas; Produção social da vida: tecendo a infância campesina. Para organizar os passos a opção foi por uma investigação de natureza qualitativa. O estudo de caso foi a estratégia investigativa escolhida para conduzir as análises. Já a etnografia visual foi método que organizou e conduziu a investigação, abrindo possibilidades de uso variado de técnicas para construção dos dados. Elegi ainda uma ação interativa, denominada Poteca, que se tornou desencadeadora das narrativas orais das crianças, bem como da participação dos adultos. Não se trata apenas de uma estratégia metodológica, mas uma ação desencadeadora de vários diálogos no decorrer da investigação. Consiste numa biblioteca de base oral formada por potes de barro, onde os participantes se lançam numa entrega que se inicia com a ornamentação dos potes e segue com a interação dos narradores com os objetos significativos que escolheram para desencadear as narrativas. A amplitude que a base teórico-metodológica ofereceu permitiu o uso de outras técnicas como entrevistas, grupo focal e um momento de trocas que ao registra-las denominei de diário dialógico de aprendizagens. A multiplicidade de vozes que permitiu a compreensão das culturas infantis e dos processos identitários das crianças se expandiu possibilitando que as vozes de educadores, das lideranças e dos griôs também ecoassem em todo desenvolvimento do estudo. Uma trama conceitual foi elaborada para permitir a sustentação tanto teórica quanto metodológica da investigação. Dentre as teias dessa trama, foram mobilizados estudos acerca da constituição das memórias e identidades individual e coletiva; formulações no campo dos estudos culturais, sobretudo, construtos teóricos sobre cultura e hibridismo; e ainda estudos de um campo da Sociologia chamado Culturas da Infância. Com essas teias conduzi a ação epistemológico-investigativa passando pelas perspectivas sociológica, histórica, antropológica e sócio-política do ser criança; Conclamei os princípios da dialética para manter uma coesão entre construtos teóricos e metodológicos, e ainda justificar a opção por uma narrativa que integrou as diversas vozes e diversos sentidos que envolve a infância campesina no Assentamento Rose. Assim, simultaneamente apresentei, analisei e registrei fatos, pessoas e conhecimentos. Com esse movimento teórico-conceitual foi possível ampliar o olhar para a constituição identitária das crianças nos planos social, educativo, cultural e sócio-político. O contexto de luta, o preconceito e a criminalização cotidiana dessas crianças faz surgir uma dinâmica de produção e autoprodução através da qual essas crianças não só vivem a infância, mas também se afirmam como um coletivo culturalmente organizado e produtivo. Essas percepções sobrevieram com as histórias geradas nas interações proporcionadas pela Poteca. São as experiência que se transformam em narrativas orais, e agora seguem registradas, sistematizadas e analisadas.
Programa de Pós-Graduação: 
Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade (Poscultura)
Nome do(a) Aluno(a): 
Souza, Leila Damiana Almeida dos Santos
Orientador(a) (es/as): 
Matos, Edilene Dias