No norte da Síria, em uma região conhecida como Rojava, está atualmente em curso um experimento de auto-organização política singular. Com a deflagração de uma guerra civil no país, em 2011, os curdos, maior grupo étnico de Rojava, viram nas novas circunstâncias uma oportunidade para pôr em prática um projeto de organização política baseado nas ideias de seu líder, Abdullah Öcalan. Fundamentando-se no combate ao patriarcado e ao Estado-nação, e propondo um modo de vida alternativo, os curdos têm construído um sistema de administração local que, inserido em um complexo contexto geopolítico, desafia pressupostos caracteristicamente modernos e ocidentais. Nesse sentido, este trabalho se propõe a analisar e contextualizar o experimento de Rojava diante de suas contradições e relações com o mundo. O foco recai sobre a interação entre o discurso produzido em Rojava e aquele conhecido como “modernidade ocidental”, com o objetivo de entender se e como essa interação produz conflitos discursivos característicos da política. A partir de uma perspectiva feminista pós-colonial, e mobilizando conceitos como “política(o)”, “desentendimento”, “orientalismo”, “internacional”, “universalismo” e “feminismo”, argumenta-se que a narrativa de Rojava politiza a modernidade ocidental e expõe padrões de inclusão e exclusão e relações de colonialidade intrínsecos ao sistema internacional e ao(s) movimento(s) feministas.